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#SOA_013 | estatística do caos
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#SOA_013 | estatística do caos

sobre números, superações e a necessidade de ser sustentável
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Esta é a 13ª newsletter, e confesso: está intenso e caótico. Entre validação, paixão e números, a arte continua sendo uma corda bamba entre sonho e sobrevivência. Vai ser sempre assim?

Dizem que o número 13 é mágico. Para mim, virou uma estatística de superações, ilusões e frustrações. Há 13 semanas escrevo compulsivamente, mergulhada em dúvidas e, quase sempre, sinto que estou realmente sufocando. A cada palavra, me pergunto: quem está lendo? Será que apenas ecoo no vazio? Ser artista é resistir ao maremoto de caos interno, transformá-lo em trabalho, enquanto navego no oceano do caos externo de opiniões, boletos e o eterno "estou me afogando; cadê meu colete salva-vidas? Está dentro ou fora de mim?"

O labirinto das estatísticas

Comecei a tentar “ler” as estatísticas de números e públicos por aqui. O Substack me enche de gráficos: cliques, assinantes, desistências. 50% dos assinantes leem meus textos, mas e os outros 50%? Spam? Lixo? Esses 50% que leem: é muito ou pouco? Qual é o parâmetro? Qual é a meta que eu deveria ter?

Estatísticas refletem algo, mas nunca tudo. Medir impacto é exigência de editais, patrocinadores e até da nossa conta bancária. Ainda assim, não podemos deixar que os números definam o nosso valor. Fácil falar, mas os números são esmagadores. Fico feliz de ser péssima em matemática. Feedbacks de leitores me energizam com um combustível alucinante, mas a angústia persiste: como sair da bolha do "círculo de amigos"?

É angustiante. Hoje, a maior parte da minha rede ainda é privada, e recebo mais feedbacks por WhatsApp ou e-mail do que publicamente. A cada mensagem de alguém que encontrou o SOA no Instagram e o usou para entrar em algum edital, meu corpo vibra de alegria. Isso importa? Sim. Mas o fato cruel é que qualquer desejo que precisa ir além do sonho e se transformar em trabalho esbarra numa realidade: precisamos de dinheiro. Só eu, né? (risos nervosos)

Ana Elisa Egreja - “Saboneteira branca com duas esponjas”, 2024, Óleo sobre tela, 50 x 40 cm Foto: Julia Thompson

A validação e o círculo de amigos

Qualquer curso de impacto social te diz: amigos e família são os primeiros "consumidores". Mas eles também têm o costume de pedir favor, assim como eu peço — desde ingressos ao samba porque não tenho 10€ sobrando, até ajuda para divulgar links e conteúdos.

Todos queremos nosso trabalho valorizado, mas poucos conseguem, presos entre bloqueios psicológicos e capitalistas. Quero crescer além dos amigos. Como transformar amigos e conhecidos em apoiadores reais do seu trabalho?

Quantas vezes já quis gritar: "Comprem meu conteúdo! Divulguem meus links! Ei, me repostem!" Por ora, vibro quando um seguidor desconhecido aparece. Mas que prisão é essa: depender de curtidas? Pior ainda é depender do afago, do carinho, do like dos seus companheiros. Porém, aqueles que me olham me enxergam como uma gata: independente. Será que os artistas deveriam ser mais gatos e menos labradores, largados nos sofás, esperando alguém chegar e dizer como somos lindos? Quem nos tira para passear fora da nossa própria mente?

Em 13 semanas, desacelerei. Publicações, estudos, editais — tudo parece mais difícil. No início, era explosão, força motriz da ideia. Agora sinto o peso do tempo e do custo de continuar. Sozinha. Dedico tantas horas e não ganho nada: enlouqueço. E sem dinheiro, como seguir? Esse processo de trabalho está sendo tão exaustivo, um dos mais difíceis da minha vida. Como trabalho, preciso aprender a monetizar. Como vida, preciso aprender a não necessitar tanto do outro?

Valorização começa dentro de nós, ouuuukai, mas é sustentada por uma comunidade que acredita no que fazemos. Sem o outro, não existimos. Nem esta arte que proponho existe sem uma troca coletiva. Elitismo não é uma opção aqui.

Solidão e egoísmo são caminhos perigosos para quem cria. Passo o dia escrevendo, esperando que o final da terça-feira traga um jantar, um abraço, um "eu te li". Mas a frustração chega quando, no lugar da escuta, encontro parceiros que priorizam a própria imagem no espelho, desmarcam tratados de afeto e parecem deixar de lado o cuidado mútuo. Terças viraram dias de suor e sacrifício, e quem me acompanha na angústia da escrita e publicação pública são todos os meus fantasmas. Vocês percebem?

O dilema da monetização na arte

Você já se perguntou: o que sustenta sua prática artística? Paixão? Dinheiro? Validação externa? A eterna tentativa de evitar que chamem isso de "hobby"?

Tenho me inscrito em cursos, webinars, podcasts, doutorados (um deles abandonei), numa lista infinita de coisas que nunca parecem suficientes. Três línguas? Preciso de quatro? Como você não fala francês? Não conto, então, a lista de livros que TEM QUE ler.

O que me autoriza a falar sobre arte? Meus 15 anos como produtora? Diplomas? Nada disso. Nunca contratei ninguém olhando apenas currículos. Mesmo assim, sigo acumulando formações que nem sempre consigo processar. Contraditória? Sempre.

Meu acúmulo de cursos, faculdades (sim, faculdadeS), meu CV robusto, viagens a museus mundo afora, catalogando e mapeando artistas... Acúmulo de ecobags nada sustentáveis de festivais de cinema. Tudo privilégio, elitismo que achei necessário para me validar. Ganhar dinheiro para gastar assim: me autoafirmando por fora o que não era concreto por dentro. Fazer parte da elite intelectual custa mais caro do que manter uma carreira como artista. E isso só descobrimos quando chegam as primeiras dívidas psicológicas e as primeiras validações externas.

Não é à toa que a tese de que, para ser artista, é preciso ser rico, perdura. Autoridade baseada em quê?

Ana Elisa Egreja - "Saboneteira rosa", 2020. Óleo sobre tela, 40 x 30 cm. (@anaelisaegreja) é representada em São Paulo pela Galeria Leme (@galerialeme) (Foto: Divulgação)

O peso de ser imigrante e o custo da sobrevivência

Estive no dentista esta semana. "600 euros pela prótese", ele disse.

Não é só dinheiro: é mais um lembrete do custo sufocante de viver ; é um lembrete cruel de como viver como artista-imigrante pesa no bolso e na mente.

Saí do consultório e voltei a pé. Culpada de ter ido de uber (4 euros) porque estava atrasada, caminhei 1h40 com pensamento mesquinho de que caminhar pela cidade da mais saúde e economia. A vida é feita dessas contas e balancetes medíocres e depois pedir duas cervejas e falar: estou exausta da caminhada, eu mereço. Essa caminhada sem lógica matemática foi um lembrete: imigrar é também contar cada euro convertendo para sua moeda, multiplicar Trump eleito inflação, guerra e se perguntar quando — ou se — a conta fecha.

Um dente leva ao outro. Seguro de saúde que eu tinha com contrato de trabalho pesa. Trabalhar para outros, com salários insuficientes? Empreender e correr riscos ainda maiores? Ou aceitar que, talvez, não seja possível sustentar uma carreira artística sem sacrificar algo importante?

Ciclos de dramas

Nisso me sinto 100% artista, pois saber que seu trabalho no final é inútil e a inutilidade é a unica certeza que te faz continuar me faz seguir fielmente aqui toda semana.

Após férias, fim de ano e balanço, me dei um ano para experimentar. Foi lindo, corajosao, mas as contas: desequilibradas. Não há como esconder: o custo da sobrevivência artística em 2024 foi gigante. Às vezes penso: "E se eu não der conta?"

Esses ciclos de drama interno não são só meus. A vida do artista é tentar buscar formas de não se perder. Entre coragem e cansaço, todo começo de mês é recomeço. É preciso investir cegamente e acreditar em si fora da dimensão do real para ter retorno financeiro sustentável como artista? Afinal, me pergunto novamente: o que nos dá autoridade para falar ou criar? Talvez seja a coragem de persistir mesmo em meio às incertezas ou das tristezas.

Planejar é preciso: não só artisticamente, mas financeiramente. Preciso crescer sem esquecer o porquê comecei. Arte não se sustenta sozinha: é troca. E, como todo relacionamento, exige cuidado, comunicação, paciência e investimento. Jogar com a honestidade é uma coisa cruel, ainda mais sobre o assunto base de sustentabilidade financeira.

Estou num processo massificante de um - sem certezas de não, sem certeza de sim, aparentemente a única certeza que ando tendo é que deveria ter escutado mais a minha mãe e ter escovado mais os dentes na minha infância.

Portugal não é conhecido pelo país onde o imigrante vem na ilusão de que vai ganhar dinheiro, meu senhor. E agora, nem rir alto e ter culpa por isso, como disse semana passada, vou ter. Vou ter culpa de não ter escovado os dentes suficientemente para poder mostrar melhor os dentes - por 600 euros quero um dente de ouro, quero ser artista e chamar minha produtora de "dente de ouro produções".

Ana Elisa Egreja - Cobras e quindins sobre prato comemorativo IV Centenário, 1954. Homenagem da câmera do DF para SP, 2022 - Óleo sobre tela, 30 x 30 x 2,5 cm, Foto: Filipe Berndt

Vive-se a despeito da falta: a incerteza como caminho

É Canva, é website, agora tem que pagar o ChatGPT? Eu já pago o Gmail, o Dropbox, o iCloud, o Netflix, o Mubi, a Amazon - todo o meu dinheiro fixo indo para grandes corporações. O que sobra é livro, sebo novo, dos amigos - é show, exposição, cinema. Teatro? Nunca mais fui. Em Portugal, fui ao teatro uma vez? Motivo? Dinheiro. Ainda prefiro gastar em cinema, triste. Show, quando ganho ingresso grátis ou é artista que acho que vai morrer em breve pela idade.

Quero uma bolsa de artista, que pague o meu site - meu Canva - as 800 inscrições de cursos e livros que preciso/quero fazer. E a formação básica real de quem trabalha com arte: assistir arte, consumir arte, respirar arte. Eu mesma digo e repito: os meus cursos, o artista precisa de repertório.

Eu compro livro, faço curso, ando associada até da Amazon para poder ganhar alguns trocados. Caminho entre o desejo de criar e a necessidade de sobreviver. Parece que estamos sempre equilibrando a corda bamba entre "repertório" e "sustentabilidade".

Eu, CEO de mim mesma

Quero autoridade sobre minha jornada. Sobre meu processo. Quero dizer "sim, sou artista" sem hesitar, sem medo de parecer que ainda não cheguei lá.

Arte é uma jornada coletiva, e esta newsletter é parte do meu processo de encontrá-la. Não quero ser uma superempreendedora, mas uma produtora que encontra o caminho entre caos e estrutura.

Dá para sobreviver nas artes sem querer ser uma superempreendedora? Espero que sim. Não quero empreender. Minha jornada aqui essa semana não é um grito de desistência, nem de desespero, mas um pedido de companhia. Não quero me sentir sozinha.

A arte não chega para todo mundo. E por isso esse projeto. Quando pensei no nome - Se Organiza, Artista - e chamo sempre nas comunicações como meus artistas, sim, meus artistas, porque se estão aqui, sei que têm interesse e trabalham na cadeia criativa. Mas como fazer esse vocativo quando a maioria não necessariamente se sente artista ainda? Assim, fazendo, seguindo e acreditando em conjunto.

Se gostou do texto, do projeto, me ajude divulgando, dando like pela plataforma, clicando nos links que divulgo. Se puder, contribua financeiramente para manter o projeto com o oxigênio de expansão.

Investir em arte é acreditar no impossível — inclusive em si mesmo.

Até semana que vem.

Com carinho e energia,

Chaiana Furtado
Beijos de #FocanaLuz ✨

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Estudar é preciso! Meus descontos

Inaugurando essa sessão de cupons que tem como objetivo primeiro gerar alguma renda para o projeto:

  • Associada Amazon: Infelizmente, hoje o único que consegui me associar é a coisa chamada Amazon, a mais predadora forma de comprar livros. Não à toa, eles facilitam bastante. Funciona bem, eles pagam corretamente e enfim, não vou problematizar agora enquanto não tenho a percepção de uma melhor forma de me gerar alguma renda e descontos para os que me leem. Incentivo vocês a conversarmos sobre os livros que eu li. Meus links dos livros que eu indico, com comentários sobre minha leitura e observações, moram aqui no Pinterest e também no perfil no meu Instagram nos destaques de link de livros. No momento, o link de desconto só consegui pela Amazon do Brasil.

  • Assinatura da newsletter: Acabei de habilitar essa função - para quem puder e quiser me apoiar a seguir trabalhando com o Se Organiza Artista! Peço a contribuição de 5€ mensais ou 50€ anuais - que é o mínimo que a plataforma deixa cobrar. Tudo que hoje produzo continuará grátis, não gostaria de ter que habilitar sessões e conteúdos exclusivos a assinantes, pois não foi a lógica da criação do projeto. Sinceramente, espero conseguirmos. Ainda não sei bem como funciona o plano aqui de assinaturas, pretendo descobrir. Mudem para o plano pago se puderem e apoiem financeiramente esse projeto.

  • Curso na EBAC - A EBAC é a Escola Britânica de Artes Criativas e Tecnologia e, num misto de compulsão, black friday, ótima negociação, me inscrevi ontem em dois cursos da plataforma e consegui, sendo aluna, o desconto de R$350,00 para 10 humanos que se inscreverem por esse meu link.


🏹 #SeInspiraArtista

A artista dessa semana que dialoga com o nosso tema é a Ana Elisa Egreja.

“Voltado à representação de naturezas mortas e cenas de interior, o trabalho de Ana Elisa Egreja tem a colagem e a encenação como procedimentos fundamentais. Ao combinar temas recorrentes da tradição pictórica com elementos díspares como animais, mercadorias, arquitetura e objetos emblemáticos, Egreja engendra cenas ricamente detalhadas de um realismo mágico que articula a memória coletiva nacional e a história da arte.

Suas obras, representativas de uma temporalidade imprecisa e não linear, desencadeiam reflexões sobre domesticidade, noções de bom gosto, memória, bem como sobre o virtuosismo na representação de texturas, opacidade e brilho dos materiais.” Fonte: https://millan.art/artistas/ana-elisa-egreja/


☎️ Chamadas abertas em destaque - Portugal💥

Para todas as chamadas em aberto que publicamos, dicas gerais e materiais de estudo e pesquisa acesse nosso Bento.me ;)


🔮 Se Organiza, Artista meu!

Encontre todos os links com as chamadas publicadas através das nossas redes bio.site/seorganiza.artista. Monte sua agenda de interesses e não se desespere. Prepare-se para as chamadas com calma, fé e sem desistir. ;)


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